Começa hoje a série de TEXTOS DE RECESSO, em que, pelo mês de janeiro inteiro - o mês mais ressacado dos meses - eu postarei textos meus que são de anos anteriores e que, à meu ver, valem a pena serem resgatados. Pode botar fé que são ótimos textos, tá?
Enfim, por toda o mês de janeiro, semana a semana, reeditarei tais textos e, como agora, eu tenho um público novo e, consequentemente, maior aqui na newsletter, acho válido reatualizar e apresentar expressões que já tive.
Caso me bata algo muito forte, um arremate de inspiração, eu postarei texto novo, caso não, só mês que vem.
Fé pra todes e boa leitura. Aproveitem.
É sabido que, nos tempos atuais, nessa contemporaneidade que explode em crises sociais, existenciais, numa (boa) instabilidade do status quo, há, também, um conforto em proferir que a crise também é sexual.
Confunde-se gênero com sexo; transamos demais; transamos de menos; todo o mundo quer transar; ninguém sabe como transar; transar é o gozo; transar é o trauma; transar é fácil; transar é difícil; quero transar sempre; não quero transar nunca mais.
Uma crise que recai sobre o sexo, demonstra a certeza de que não só o status quo está sendo tensionado, como também é uma necessidade de mudança. Necessidade básica mesmo, assim como a fome avisa que temos que comer, qualquer crise avisa que temos que mudar, quiçá, revolucionar.
Do sexo mais concreto até o não-sexo, daquilo que tange desde o início da criação humana - em todos os sentidos - denota o núcleo do conceito de potência, potência essa que atravessa o corpo humano, até o corpo assexual, pois, o corpo assexual não é um corpo desprovido de prazer.
Bom, a crise - portanto, a necessidade de mudança - tem nome, corpo, endereço e performance: Homem-cis-macho-patriarca-capitalista.
Os famigerados e pífios “detentores do falo”.
“(…) É a falta sempre presente, seja como ameaça ou como fato consumado. De modo mais apurado, o que é sustentado como elemento organizador da sexualidade não é o órgão genital masculino, mas a representação psíquica imaginária e simbólica construída a partir desta região corporal do homem.” (Costa, A & Bonfim, F. 2014)
Tais detentores do falo, detém o poder. Detém a força, detém o líquido da criação, ó, sustentáculos da costela de Adão, o primeiro ser humano da terra.
Toda essa situação deveras psicanalítica estruturou, basicamente, uma sociedade regila pelo falo. Ou melhor, pelo pau.
Absurdo e um tanto ridículo, quando pensado com um pouco mais de afinco.
A fixação não só no falo, mas no pau, cegou o homem-cis a ponto de que há um Rei-Mor, apenas um: O pau. Se tornando servo do próprio pau, negligenciando as potências em prol dum poder evidentemente falho e angustiante, reduzindo o além-absoluto, a transcendência, o milagre concreto que é o corpo humano.
Me soa como esquecer, (quase) voluntariamente, um universo em prol de grãos de poeira estelar.
Constrói-se desde a estrutura política até o sexo mais medíocre em prol do pau, nas performances dos antiquados machões, no preciosismo e medo do pau do outro, na opressão a quem não possui um pau, no símbolo completamente pejorativo a quem não possui pau, a impossibilidade do pau duro eterno, na masculinidade e no medo agressivo daquilo que se distancia disso, masculinidade tóxica que evidencia um desespero por grandiosidade que não hei de chegar, numa completa catástrofe delirante que é uma broxada.
Esse contorno completamente ilusório e cruel, tanto para os homens-cis quanto aos não-homens-cis, tenta um esconder falho que, repetidamente, grita uma fragilidade violentamente cruel e sufocada, desentendida, pois, se entenderem que sou eu, homem, frágil, já não sou mais homem.
Como diz o Freud - que respeito, mas, nem gosto tanto - em 1923: “(…) O que está presente, portanto, não é uma primazia dos órgãos genitais, mas uma primazia do falo”
Direto e reto: É necessário que desinstitua o falo para que haja um resgate do Corpo.
Expresso de sua completude interina, ou seja, absolutamente longe de um viés próximo de um corpo funcional, instrumental, sem divisão entre alma, corpo e mente, mas sim o que se é: Gênese da potência, da afetação e do afeto, catalisador de realidade e sonho, vida e morte, corpo-alma-mente num fluxo, não numa divisão.
Há uma necessidade de uma revolução sexual. Pois, uma revolução sexual é pilar para uma Revolução das Revoluções.
É gritantemente preocupante que uma forma de performar no mundo, sendo a de homem-cis, esteja embebida de violência tanto para si, num cocho de retalhos de angústias reprimidas, quanto para todas as outras performances existenciais, ou seja, mulheres cis e transgêneros, gays, travestis, não-binaries, aqueles que diferem da norma. Norma (homem e cisgênero) essa que soa como uma criança mal cuidada que diz “O brinquedo é meu, então, eu faço a brincadeira”.
É inadmissível que uma sociedade composta por seres desejantes e desejados de desejos completamente distintos seja estruturada na base da pirraça.
Quando, no título, digo que a pele é o maior órgão sexual, aponto justamente para esse ponto revolucionário: A não-negligência do corpo. Numa expansão de olhares para o todo que veste corpo e, ainda assim, deixa nu, da forma mais sublima e deslumbrante possível, em detrimento de uma expansão, experienciação, expressão da mais completude de prazer.
Aquilo que toca e é tocado, faz sentir e sente.