Hei eu de - relativamente - datar este texto.
Anda difícil escrever ainda que a vontade e os textos e os haikais e os tweets gargarejem na garganta de meus dedos, mas, de todos os cansaços que eu já proferi pelas vielas das ruas e da internet, esse é um dos mais sinceros, genuínos e destituídos de drama. Há um cansaço-manifesto em todas as áreas que contemplam minha existência, meu corpo, meu coração e minha mente.
Exaurido. Cansado. Esgotado. Moribundo. Melancólico. Dolorido. Latejante por usar demais.
Esse fora um ano que exigiu demais de todos. No macrocosmo você pode escolher sua dose de cansaço, não acho que tenha havido sequer um respiro que não cansou esse ano e, agora, nesse mês fatídico que costumava já começar o processo de renovação desse corpo que vos fala, simplesmente não faz isso, precisa de mais tempo para que a fluidez dos rios venosos corram mais rápido, talvez regularmente... Evitarei a usar a palavra normal aqui porquê, definitivamente, também é uma palavra que foi sugada até o tutano e eu nem sei se existe mais, aliás, não sei nem se "normal" existe mais.
Que vá em paz a normalidade, na mesa sobram apenas as porções de absurdo.
Engoli tanto absurdo forçadamente que, talvez, por isso as gargantas dos meus dedos estejam tão incômodas e incomodadas.
No microcosmo eu apostaria um desses meus dedos engasgados que houveram inúmeras doses de exaustão em suas atmosferas particulares e não-tão-privadas pra quaisquer tipo de gente. Não falo dos ricos, eu falo de gente. Gente mesmo. Ricos não são gente, são anti-gente.
A intensidade aterradora vivida no Brasil nesse ano foi ímpar.
Me pergunto se, no processo de redemocratização pós 64, as pessoas estavam eufóricas ou deveras cansadas. O combo "fim" da pandemia + eleições brasileiras é algo que não desejo a nenhuma existência. Lembro que vislumbrava lá em 2020 um tipo de final da pandemia, final esse que significava um final de muitas coisas, como quem vislumbra um vaga-lume que pisca na obscuridade e, então, dizia pra mim mesmo que eu seria um estouro, um soltar de fogos, carnaval num corpo só, a própria extroversão dos astros e, aí, nesse "fim" com aspas demais, eu me vejo cansado, na ânsia que esse ano de 2022 acabe pra que eu possa, no sentido simbólico da coisa, focar-me num tipo de ascensão, ou melhor, num tipo de renovação, pois, agora... Agora, agora mesmo, tenho plena certeza que não tenho o vigor pra isso.
É como se fosse uma ressaca megalomaníaca.
Esses dias andava na rua, logo após a academia, com a endorfina no corpo e um cigarro de maconha recompensatório para quem está na tentativa diária do desatrofiamento das articulações, ou seja, depois de malhar, eu fumava um baseado em caminho da minha casa, observava o mundo, como um poeta urbano que já fui, olhava as ruas pós chovidas, asfalto molhado que transado a água ganhava características do espelho quase dando corpo a luz refletida do poste, lembrei de quando me preocupava em fazer da rua minha escrita, do vivído, da boemia, em comparação agora em que, se eu bebo um dia como um bom boêmio, eu perco um dia, talvez um dia e meio, como quem um enfermo.
A ressaca é um ponto de passagem de tempo interessante e pouco usado nas denotações científicas ou levadas a sério, porém, poucas coisas conseguem me dizer perante a filosofia que traça o tempo que eu sou, sim, jovem, mas, não tão jovem quanto já fui.
Escarra a verdade na minha cara.
Tenho estado preocupado com minha saúde nesse fechamento de ano, como quem procura a cura para essa ressaca ou uma fonte de rejuvenescimento. Nesse sanar das cortinas eu desejo alguns fins, entretanto, até os fins ficaram mais pesarosos. Vejo meus amigos que estavam comigo a cinco, dez, quinze anos e vejo que tudo mudou e nada mudou ao mesmo tempo. Na contraditória do conflito entre "Somos o que somos ou somos aquilo que queremos ser?" não há uma resposta depois do ponto de interrogação, à meu ver, há uma resposta no meio da frase, pois, somos o limbo dessa frase. Não é ruim, mas, também não consigo dizer que é bom.
Vide, não há, necessariamente uma melancolia nesse cansaço-manifesto, nem necessariamente um tédio, há talvez um contentamento descontente... Mas, talvez essa também possa ser uma das milhares de explicações para se errar o que é a vida. Se não um contentamento descontente, um descontentamento contente.
Saio desse ano, enfim, morando sozinho, numa casa minha que a luz invade, algo raro na cidade; um livro lançado que se alimentou do ranger dos meus dentes; Binariamente apaixonado e, após o drama, desapaixonado; pensado mais do que já pensei sobre ser pai de alguém; andado e conhecido mais Minas Gerais; pessoas que não queriam que saíssem da minha vida, saídas; com dores físicas; mais calmo que ansioso; mais contente que triste; mais cansado que vivo; com a barriga maior, com o cabelo maior, com o coração maior.
Eu materializei desejos e angústias como um ferreiro que bate no aço em busca de uma forma bela, funcional e simbólica e, quando não forjava - ou desenferrujava - alguns alicerces existenciais, eu bebia. Me embebia de algo que não beijava a minha sobriedade.
Tive muitos medos esse ano, muitos medos mesmo e saio desse ano com menos medos, mas, todos esses medos me fizeram descobrir que meu quarto pode ser, sim, o meu país. Descobri que a curva que minha cama faz quando deito meu corpo nela pra descanso é uma das curvas mais lindas que já vi na minha vida e eu sou aficionado por curvas.
Transei menos do que eu queria, desejando transar mais do que eu queria. Desemboca uma agonia quando os lençóis ficam secos por tempo demais.
Senti faltas nunca antes sentidas e esqueci faltas que o fundo da minha memória sempre lembrará.
Tiro deste ano numa bravata que diz "Tiro de tudo, mas, nada tiro de mim mais" sabendo que, se fosse uma promessa, nalguma falha da confiança no amanhã, eu quebraria, mas, juro que mais firme que antes.
Não me acho o maior errante do mundo, até acho que erro pouco, mas, não quero me desculpar mais, quero simplesmente ser melhor.
Pode confiar. Eu confio.
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Gosto de como seus textos falam comigo. Que a chegada de 2023 nos traga a energia e um novo tipo de paz que ainda não mora dentro da gente <3