nada em nenhum lugar em tempo nenhum.
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Se tu curte essas inutileza de falazada, considera se inscrever aí no NADA EM NENHUM LUGAR EM TEMPO NENHUM que você vai receber essas paradas todas toda semana.

Enfim, volto. Volto aqui, volto a escrever. Não sei se vai haver no leitor uma sensação de quem vê uma volta, mas, para mim que vivo meu corpo vivo, soa como uma volta. Um retorno.

Parece que nas últimas semanas a existência exigiu demais, no macro, no micro, na tangente, no centro, no cima, no baixo, na vida, na morte, na ida e na vinda. Para além das especificidades, o ano é pesado. O alívio e o gozo houveram, mas, a sensação de desmaio por falta de ar também foi vigente. Ainda bem que existe o respiro. Pra mim e pra todo mundo.

Tenho pensado em demasia sobre voltar.

Volver.

Essa coisa do voltar tem tantos significados que parece um descontrole da língua. Voltar de onde? Pra onde? Revirar-se também. Dar voltas. Dar uma volta, dar outra volta.

Palavra que fala sobre o ir e vir, mas, também, sobre um tipo de movimento circular, como se a palavra, numa tentativa forçosa de quem cria, quisesse preencher o espaço e também o tempo.

Voltei pra casa de meus pais nesse mês passado pra passar alguns dias e essa volta faz com que voltem tantas lembranças. É um movimento de aterrissagem, como quem acabou de chegar em seu envolto. Revi amigos, revi a cidade de interior, revi o calor absurdamente infernal. Voltei a dormir mal, o quarto de infância não cresce junto com o corpo da gente. Meus amigos me perguntavam "Quando que cê volta?" e eu dizia que eu não sabia. Voltei e me tatuei. Voltei lá com vontade de voltar pra cá. Um amigo meu que está em seu auge social, um dia, num bar, disse: Matheus, você tem voltar a ser mais dado, mais social, mais gente. Depois ele me disse: Depois que eu entendi que a gente vai morrer e que poucas pessoas vão lembrar da gente... E nem terminou, não precisava, as reticências contém odisseias entre os três pontos. 

Ele tava certo, ele, geralmente, está certo.

Não é nada que não sabemos, a questão não é sobre a máxima da verdade dita, mas, sobre as arestas dessa verdade. O tom.

Voltei pra Belo Horizonte ontem depois dessa ida pensando sobre o que eu queria voltar. Voltar a ser, voltar a ter, voltar a ver, voltar a fazer, voltar a criar, voltar a lamber. Sobre o movimento de ida e volta me lembro que, no meu último namoro, fomos e voltamos por volta de umas oito vezes.

Ir e voltar, ir e voltar, ir e voltar, ir e voltar, ir e voltar, ir e voltar, ir e voltar, ir e voltar.

A pele virou seda.

Hoje sinto falta de me voltar ao amor, já não exerço o meu amor lanceiro em sua plenitude a uns três anos, eu que sempre fui mais parte da minha vida apaixonado do que desapaixonado, apesar dos pesares. Neste ano voltei a me apaixonar. Me apaixonei como quem voa e cai com estilo. Voltei-me pra sentimentos que, como quem renasce, ainda sabe mexer pouco, as articulações não estão muito azeitadas. Depois voltei a me desapaixonar e a vida é assim.

Na volta representada pelo movimento circular lembro-me de Ouroboros, a serpente que abocanha o próprio rabo, denotando a infinidade do tempo, mas, pouca gente fala sobre a metáfora narcísica que a serpente-que-abocanhou-o-próprio-rabo tem. Será que tem pungência de engolir a si própria? Será que temos? 

Me perco no pensamento inútil de pensar se, caso consiga engolir, seria mais Ouro- ou -Boros.

Acho que se a gente se engolir a gente não se completa, a gente vira metade. A gente foi feito pra ser povoado, não colonizado.

Quero voltar a abrir meu corpo pra turismo dos afetos, acho que esse é o chamado da volta, do voltar. Pra gente ficar, pra gente voltar, pra gente ir e vir.

Rodrigo Amarante diz, numa entrevista, que o objetivo de toda a viagem é a volta, sendo essa volta a volta pra si mesmo. Levo isso como ética.

Nesses anos enclausurados acho que a paranoia invasora tomou conta, em estado vicioso de alerta, neurose em seu auge e, na tentativa de prever qualquer invasão, barrei as águas que irrigam as raízes das plantas e, assim, não faz sentido a vida viver.

O negócio é saber entrar e sair.

Ir e vir.

Vir e voltar.

Não diga a eles que fico. Diga a eles que volto.

Tô voltando.

3 Comentários
nada em nenhum lugar em tempo nenhum.
nada em nenhum lugar em tempo nenhum.
sobre nada em nenhum lugar em tempo nenhum, e tudo de mim pro mundo e do mundo pra mim.
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matheus morais inácio.